💾 Uma introdução a memória

Memória é a capacidade do cérebro em que informações e dados são codificados, armazenados e recuperados quando necessário. Se não pudéssemos reter informações ao longo do tempo seria impossível desenvolver linguagem, relacionamentos com outras pessoas e animais ou até mesmo o o seu senso de identidade. Nosso cérebro armazena informações ao longo do tempo para influenciar ações futuras. A memória é uma habilidade bastante complexa e não a compreendemos completamente. Para nossa discussão, entretanto, vamos considerar que temos dois sistemas de memória: a memória de trabalho e a memória de longo prazo.

A memória de trabalho é a parte da memória que lida com aquilo que você está imediatamente processando de maneira consciente em sua mente. Estudos utilizando técnicas de ressonância magnética funcional indicam que a memória de trabalho é processada no cortex pré-frontal, a área do cérebro que fica localizada logo atrás da sua testa, mas que mantém conexões com todo o restante do cérebro.

Cortex pré-frontal. Fonte: Database Center for Life Science(DBCLS)[2]. / CC BY-SA 2.1 JP

Cortex pré-frontal. Fonte: Database Center for Life Science(DBCLS)[2]. / CC BY-SA 2.1 JP

Essa é a sua memória de trabalho… Fonte: Kelly Sikkema on Unsplash.

Essa é a sua memória de trabalho… Fonte: Kelly Sikkema on Unsplash.

A memória de trabalho funciona como uma folha de rascunho ou um quadro-negro, nós colocamos informações ali para algum trabalho temporário e quando não precisamos mais delas jogamos o rascunho fora ou limpamos o quadro. Essa folha de rascunho, entretanto, é mais parecida com um post-it do que com uma folha A4. Acredita-se hoje que este sistema de memória pode manter cerca de quatro chunks (pedaços) de memória. Temos uma tendência de agrupar conceitos e informações a medida que dominamos um determinado assunto e por isso nossa memória de trabalho aparenta ter uma capacidade muito maior. Esse processo é chamado de chunking pelos neurocientistas.

Este sistema de memória é bastante frágil pois o seu cérebro precisa liberar as informações que estavam ali quando você muda de tarefa. Mesmo uma pequena distração como parar para checar o Whatsapp pode ser o suficiente para que o cérebro jogue fora o rascunho mental que você estava usando para executar uma tarefa. Isso reforça a importância de reduzir distrações durante o trabalho e estudo. Veremos técnicas de estudo e trabalho que se baseiam nesse fato para otimizar nossa produtividade.

A memória de longo prazo, por outro lado, é como se fosse um grande armazém de informações. Esse sistema de memória está distribuído por todo o volume do seu cérebro. A memória de longo prazo é o sistema que armazena os conceitos fundamentais e as técnicas que você está tentando aprender. A quantidade de memórias que conseguimos armazenar é tão grande, entretanto, que encontrar alguma informação específica pode ser bastante difícil. A prática repetida facilita esse processo, é a forma de dizer para o seu cérebro armazenar alguma informação de forma que seja acessada com maior facilidade no futuro.

A sua memória de longo prazo é parecida com um grande armazém de dados e informações. Tudo está catalogado lá e você consegue acessar qualquer memória, mesmo que demore algum tempo para se recordar delas. Fonte: Nana Smirnova on Unsplash.

A sua memória de longo prazo é parecida com um grande armazém de dados e informações. Tudo está catalogado lá e você consegue acessar qualquer memória, mesmo que demore algum tempo para se recordar delas. Fonte: Nana Smirnova on Unsplash.

As informações guardadas nesse sistema de memória também sofrem degradação com o tempo. Tente se lembrar de alguma história que aconteceu contigo há bastante tempo. Você provavelmente se lembra do contexto geral, das pessoas que estavam contigo, mas terá muita dificuldade de se lembrar, por exemplo, das roupas que estava usando ou outro detalhes muito específicos. É como se o tempo fizesse com que suas memórias ficassem desfocadas.

A prática deliberada e repetida é a forma de comunicar para o seu cérebro quais informações devem ser armazenadas com mais detalhes e com fácil acesso. Cientistas descobriram que o treinamento espaçado gera efeitos no aprendizado muito mais duradouros do que tentar aprender algo de uma só vez. O interessante é que o espaçamento específico no tempo parece ter pouca relevância nesse efeito, desde que você de fato pratique a mesma coisa repetidas vezes.

O tempo tende a desfocar suas memórias armazenadas no sistema de longo prazo. Fonte: Trace Hudson from Pexels.

O tempo tende a desfocar suas memórias armazenadas no sistema de longo prazo. Fonte: Trace Hudson from Pexels.

Esse fenômeno faz bastante sentido no nosso modelo de memória de longo prazo e deve ser utilizado para orientar o seu planejamento de estudos, as repetições precisam ocorrer em dias diferentes. Praticar uma nova técnica de solução de problemas 20 vezes em um mesmo dia não gera o mesmo efeito de praticar a mesma técnica três vezes ao dia durante 7 dias seguidos ou ainda durante 3 dias alternados. Esse espaçamento toma proveito do seu modo difuso e dos processos que ocorrem durante o sono para otimizar suas memórias.

[Karpicke, J. D., & Bauernschmidt, A. (2011). Spaced retrieval: Absolute spacing enhances learning regardless of relative spacing. Journal of Experimental Psychology: Learning, Memory, and Cognition, 37(5), 1250–1257. https://doi.org/10.1037/a0023436](https://s3-us-west-2.amazonaws.com/secure.notion-static.com/0bb2065e-ca04-48b2-bae9-b630507c8b80/2011-09722-001.pdf)

Karpicke, J. D., & Bauernschmidt, A. (2011). Spaced retrieval: Absolute spacing enhances learning regardless of relative spacing. Journal of Experimental Psychology: Learning, Memory, and Cognition, 37(5), 1250–1257. https://doi.org/10.1037/a0023436

[Rohrer, D., Dedrick, R.F. & Burgess, K. The benefit of interleaved mathematics practice is not limited to superficially similar kinds of problems. Psychon Bull Rev 21, 1323–1330 (2014). https://doi.org/10.3758/s13423-014-0588-3](https://s3-us-west-2.amazonaws.com/secure.notion-static.com/16e72f10-5db7-4c2d-a44a-4118ae138b63/Rohrer2014_Article_TheBenefitOfInterleavedMathema.pdf)

Rohrer, D., Dedrick, R.F. & Burgess, K. The benefit of interleaved mathematics practice is not limited to superficially similar kinds of problems. Psychon Bull Rev 21, 1323–1330 (2014). https://doi.org/10.3758/s13423-014-0588-3

Linkei alguns artigos que trazem evidências sobre a efetividade desta técnica. O último deles, de 2015 mostra que mesmo depois de 1 dia a retenção de conteúdo daqueles estudantes que utilizaram a técnica de práticas espaçadas (interleaved) foi muito maior do que a dos estudantes que estudaram todo o conteúdo em sessões no mesmo dia (blocked). Repare ainda como a técnica fez com que os estudantes mantivessem a memória do conteúdo estudado mesmo depois de 30 dias. O estudo em bloco até funciona se o teste for logo na sequência, mas a retenção cai bastante após 30 dias.

https://s3-us-west-2.amazonaws.com/secure.notion-static.com/132dee8e-c8c2-4924-a82f-154990bf2c30/interleaved_practice.png

[Rohrer, D., Dedrick, R. F., & Stershic, S. (2015). Interleaved practice improves mathematics learning. Journal of Educational Psychology, 107(3), 900–908. https://doi.org/10.1037/edu0000001](https://s3-us-west-2.amazonaws.com/secure.notion-static.com/d04346c2-6dec-44fb-b365-4a86394f7ce4/ED557355.pdf)

Rohrer, D., Dedrick, R. F., & Stershic, S. (2015). Interleaved practice improves mathematics learning. Journal of Educational Psychology, 107(3), 900–908. https://doi.org/10.1037/edu0000001